Frei Bento é um filósofo, teólogo e escritor que já foi coordenador do Programa Fome Zero, que ainda no começo do Governo Lula foi substituído pelo atual Bolsa Família, ele escreveu dois livros em que analisou os Governos petistas: A Mosca Azul – Reflexão Sobre o Poder e Calendário do Poder.
De Quito, para onde foi nesta semana para ministrar palestras, ele
respondeu por e-mail aos questionamentos do EL PAÍS sobre o momento
político atual.
R. O juiz Sérgio Moro prestou um serviço ao PT que,
devido às denúncias de corrupção que envolvem alguns de seus dirigentes,
andava com baixa autoestima. O apoio de amplos setores da população ao
Lula demonstra que ele continua a ser um líder de massa, talvez o único
hoje no Brasil. Não creio que haverá polarizações graves, além de
bate-bocas e empurrões e alguns socos. Porém, me preocupa o fato de o PT
não ter aproveitado seus 12 anos no Governo para politizar a nação. Por
isso, hoje o debate político é mais emocional que racional.
P. Você acha que a base do PT ainda está disposta a
defender Lula, mesmo diante das suspeitas de corrupção e dos cortes
feitos pelo Governo Dilma?
R. Sim, a base do PT é integrada pelo movimento
sindical, movimentos populares, setores das pastorais populares da
Igreja Católica e amplo contingente de eleitores. Embora crítica à
desastrosa política de ajuste fiscal do governo Dilma, essa base se mobiliza quando se trata de evitar o impeachment e a volta da direita no Executivo federal.
P. Você acredita na inocência do ex-presidente Lula?
R. Não tenho nenhuma razão para duvidar da
integridade de Lula. Ele seria muito burro se, com uma trajetória de
vida tão exposta, tentasse esconder algo indevido.
P. Como vê o fato de o ex-presidente morar e usar com frequência imóveis de amigos?
R. É uma opção dele, e isso nada tem de ilegal, ilícito ou imoral.
P. Como vê o futuro do PT? O que o partido precisa fazer para sair dessa crise?
R. Precisa fazer uma profunda autocrítica. Embora os
Governos Lula e o primeiro mandato de Dilma tenham sido os melhores de
nossa história republicana, muitos equívocos foram cometidos nesses 12
anos de Governo. Um deles, ter priorizado o acesso dos brasileiros a
bens pessoais, como carro, linha branca (geladeira, fogão, micro-ondas
etc), TV a cores, celular etc. Deveria ter priorizado o acesso aos bens
sociais, como educação, saúde, moradia, saneamento, transporte,
segurança etc. Resultado: criou-se uma nação de consumistas e não de
cidadãos. Daí a raiva de amplos setores que, sacrificados pela alta da
inflação e do desemprego (que já superam dois dígitos), já não pode
comprar como antes.
P. Lula já se lançou como candidato para 2018. Ele deve mesmo concorrer ou acha que é o momento de o PT se afastar do poder e se reestruturar?
R. Lula só não será candidato a presidente em 2018 se morrer antes ou se Dilma concluir seu Governo com menos de 10% de aprovação.
P. Qual o caminho para o Governo Rousseff?
R. Mudar a política econômica, mobilizar o apoio dos
movimentos sociais, promover reformas estruturais, como as política,
agrária e tributária.
P. Mudar a política econômica significa voltar ao
desenvolvimentismo? Economistas acreditam que isso pode ser perigoso
para o país, neste momento.
R. Perigosa é essa recessão agravada pelo aumento da inflação
e do desemprego. Não sou economista, mas se é para fazer ajuste fiscal o
Governo deveria, primeiro, exigir sacrifícios de quem tem mais.
Promover uma reforma tributária que obrigue os mais ricos, as 5.000
famílias brasileiras que detêm 49% do PIB, a contribuírem mais. Há que
impor um sistema tributário justo.
Fonte: El País
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